Kyra Piscitelli é jornalista e crítica de teatro. Atualmente é vice-presidenta da APCA, apoia o desenvolvimento de projetos culturais por meio das redes sociais e colabora com veículos e guias.

Stalking – um conto de terror documental

Quanto tempo demora para a gente perceber o assédio? Quanto a nossa sociedade realmente evoluiu no tema que não sai das manchetes e atinge as esferas pessoal e profissional? A peça “Stalking” encena a história real da atriz Livia Vilela, que sofreu com um stalking que trabalhava com ela em uma ONG. O abuso começou em 2015 e durou anos e causou vários problemas emocionais – e também profissionais – para atriz. Lívia se juntou a um time majoritariamente de mulheres como as codiretoras Elisa Volpatto e Rita Grillo para ter a coragem de contar essa história nos palcos. Ela divide o placo com Paulo Salvetti, que também assina a dramaturgia.

Em clima de deboche do patriarcado, a linguagem do espetáculo flerta com o universo do terror e também dos contos de fadas, com histórias como “Chapeuzinho Vermelho”, evidenciando a impunidade recorrente concedida aos homens, que aparecem como figuras grotescas que se assemelham aos lobos das histórias infantis.

Como se prova um abuso? Como conseguir sair da situação e seus efeitos na vida e no psicológico? Discutindo a violência invisível sofrida pelas mulheres e patriarcado, “Stalking”, aborda um tema difícil de forma lúdica. Prende a plateia na cronologia dos fatos e passa sua mensagem fazendo o público entrar na narrativa além de juntar os pontos. “Stalking” precisa estar no palco e a prova disso é a emoção que toma conta da plateia e uma evidente identificação. Não à toa está em sua segunda temporada. Mais do que isso, é um exercício teatral baseado em um true crime com a vítima em cena. Um ato de coragem que serve para inspirar homens e mulheres.